sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Monte Fuji ao pôr do sol



Em dias claros, vê-se o Monte Fuji desde Tokyo.
Neste caso, desde o último andar do atelier.

Tokyo bucólico

Kanji

Só mais um acontecimento da festa... 

Em Japonês, como devem saber, existem vários alfabetos. 
O hiragana, que funciona por sílabas e cada sílaba tem um caractere (ka, ki, ku, ke, ko, ma, mi, mu, me, mo etc...) e usado para palavras de origem Japonesa, o katakana, que funciona também por sílabas, mas usado para palavras de origem estrangeira e, finalmente, o Kanji, de origem chinesa, e que são os símbolos que toda a gente já viu, e onde cada caractere representa um conceito.
Naturalmente, logo no primeiro dia me escrveram o nome em katakana, mas atenção: em Japonês não existe o som "L" nem consoantes no final das palavras (com excepção do "n"). Estava bem tramada com o meu CudeLL ... duas vezes uma letra que não existe! 

E agora podem-se rir, eu cá sou a Maria Cuderu.

E como em Japonês ainda se acrescenta um "san" no fim dos nomes, passei a Maria-San ou mesmo Cuderu-San. (querida famelga, gosto muito de vocês, mas fui rebaptizada...!) 


O que eu não sabia, é que para os nomes também é possível traduzir foneticamente, mas utilizando os Kanji (os símbolos), e associar ao som do nome um conceito que tenha o mesmo som. Obviamente, podem-se encontrar várias associações som/conceito, e o jogo está em encontrar a que mais se gosta. E foi um jogo que fizemos na dita Ando-Lab Party, com vários participantes à procura de possibilidades para o meu nome. 

Soube aí também que o meu nome não é absolutamente desconhecido, tanto pelas suas ligações cristãs, mas também porque existe em Japonês o nome "Marié". 
Pensei então que se já existe o meu nome, já existirá traduzido... (oh, não vou ter jogo... pensei eu). 
Mas afinal mão, cada pessoa é livre de encontrar a sua própria tradução. De tal maneira que a forma de escrever os nomes pode ir evoluindo, conforme modas...

No meu caso então, após várias hipóteses, desde "o tecido da aldeia da Ásia", ou "o tecido que arranha da Ásia" (ai ai...),  o aluno atento de que falo no post "ando lab party", finalmente arranjou uma solução bastante mais interessante, e aprovada pelo Professor Ando:


Ma: reality   ..  Ri: Truth ..    A: A(sia) 
o SIA vem entre parentesis porque é só a primeira parte do Kanji de Asia

O que dá ... 



Reality + Truth =  Knowledge of Asia

Mas o Mr. Ando corrigiu Knowledge para Sophia. 

Em suma, o meu nome cá é mesmo:


The Sophia of Asia

(!!!)


Ando Lab Party

Vou recordando eventos à medida que tenho tempo, claro, mas também à medida que me apetece falar neles... como para os deixar amadurecer um pouco talvez, ou poder acrescentar algumas considerações, ou juntar num só relato vários episódios.

Agora com o meu novo melhor amigo (o Mac), que às vezes vem comigo para o atelier, torna-se bastante mais fácil ir escrevendo durante o meu tempo de commuter... a minha leitura é que, coitada, vai levar uma valente talhadela...

O evento que agora vos apresento passou-se na semana passada, sexta-feira. Por coincidência, ou por fruto da minha vida tripartida Tokyoita (Chiba, Tokyo, Atelier), numa mesma noite tinha três eventos: festa no atelier, para a despedida de um que acabou de ser colocado no atelier Ban de Paris ; festa de chegada a Tokyo dos Ausmips de Fukuoka (cidade noutra ilha mais a Sul), nomeadamente do Sebastien, meu outro grande amigo que veio também da faculdade de Lisboa e finalmente, uma Ando-lab Party, em honra dos anos do professor Ando, de mais dois alunos e  de mais outros quantos acontecimentos que agruparam na mesma festa.

Regra de honra posta em prática neste caso, a do maior respeito, e para Chiba me dirigi.

A festa, marcada para as 5 da tarde, na faculdade, constava de um jantar, feito ali mesmo pelos alunos – já referi em tempos que uma das salas tem uma cozinha improvisada -, com os alunos do laboratório, o famoso professor Ando e dois aliens, o belga e eu.

Continuo a referir-me a nós como aliens porque apesar de sermos já bastante amigos de alguns alunos japoneses, dentro do contexto geral do departamento de arquitectura, somos um fenómeno. Não pensem que é falta de humildade o que aqui escrevo, mas às vezes é assim mesmo que o sinto... fenómeno não por feitos realizados, mas simplesmente por sermos uma espécie de atracção.

De facto, por várias vezes já me foram apresentadas pessoas com o seguinte comentário: “they will come sometimes to talk to you”. Certo...

Tenho vindo a perceber que isto tem dois motivos: o primeiro, o facto de sermos europeus e trazermos todo um leque de conhecimentos diferentes, sobre os quais os japoneses estão genuinamente interessados. Segundo, somos um óptimo meio para eles treinarem o Inglês.

Na festa quase que vinham falar connosco à vez. Fiquei deliciada... não só é uma demonstração perfeita de acolhimento, como uma diversão pegada, para nós e para eles.

 Ao lado do Jan, à direita, o Junichi, que esteve em Lisboa, e ao meu lado, o famoso Mr. Ando, na festa

Confesso que é uma massagem ao ego extraordinária contar coisas várias, sobre Portugal, Europa... e ter pessoas a ouvir que realmente estão a ouvir e a absorver.

Exemplo: começámos a falar em torres, um dos alunos japoneses que tinha estado em Lisboa falou na Torre de Belém, em jeito de brincadeira, pelo tamanho comparado com os arranha-céus...

Eis se não quando dou por mim a dar uma pequena aula sobre Lisboa, Belém, a Torre, os Jerónimos ... apenas a tentar dar algumas luzes sobre o nosso papel nos descobrimentos e o sentido que tinham para Portugal.

Já estava contente por ter uma audiência tão atenta quando, vejo a cereja sobre o bolo: um dos alunos (de arquitectura, e momentaneamente meu aluno também...) estava a tirar apontamentos !!!

Que maravilha...

 

O quadro e o aluno atento .... 

Outra característica destes meus hóspedes é serem altamente fofoqueiros, de tal forma que qualquer informação é rapidamente circulada pelos restantes.

Um dos episódios que já me ocorreu foi de ter uma vez perguntado a um deles se conhecia um grupo chamado “yura yura teikoku”, que tinha ouvido na Fnac cá do sítio e tinha-me parecido bom. Na festa, tenho de repente um grupo de semi góticos com um ar um tanto duvidoso, a virem ter comigo com um ar feliz e dizer

“You like Yura yura teikoku? We are yura yura teikoku fans!”

Imaginem o meu espanto ... que ando eu a ouvir ?!! E que andam eles por aí a contar...!

 

De resto, a festa constou de (muito) álcool, muita comida (constantemente a servirem-me mais...) e muita diversão, que culminou com a saída nocturna... para o karaoke!

 

Não sei se sabem, mas o karaoke nasceu no Japão, e é o divertimento predilecto dos Japoneses. Em qualquer terriola, rua ou avenida existe um karaoke. Em Tokyo então vêem-se prédios atrás de prédios SÓ para karaoke. Melhor : já me constou numa das minhas aulas que há companhias imobiliárias a desenvolverem projectos onde, da mesma maneira que para nós um “extra” nos novos condomínios são os ginásios, para eles é ... uma sala de karaoke.

E do que consta? Várias salinhas, com capacidade para 2 a 12 pessoas (acho que há umas maiores mas ainda não as vi), com um ecrã gigante, 2 micros, e acessórios musicais – tipo marracas.

E os Japoneses são tão loucos por isto que nesta saída, em que deveríamos ser uma dezena, comecei a estranhar ao fim de um tempo por sermos só 5 dentro da sala. Quando perguntei onde estavam os restantes obtive a seguinte resposta:

“estão na sala do lado ... 10 numa só sala canta-se pouco”.

Ah bom... visto assim, têm toda a razão! E começo a achar que as salas maiores são só para estrangeiros... como nós.

 

Quem me conhece sabe bem que canto tão bem quanto ... uma cana rachada. Mas sim, cantei que me fartei!

Não se preocupem, não rompi os tímpanos a ninguém... estas máquinas de Karaoke são inteligentes: não só costumam estar com um volume altíssimo, de maneira que ouve-se mais o instrumental que a própria voz, como transformam a nossa voz! Dão lhe assim um certo eco, com um ar mais místico... hehe

 

E o que se canta ? TUDO. Até Madredeus lá encontrei... no meu caso opto pelas clássicas dos anos 80, que serão sempre mais fáceis! Os Japoneses escolhem, claro, músicas japonesas (têm um repertório vastíssimo!) mas também se aventuram a músicas em inglês, que obviamente dá direito a um espectáculo inédito.

Palavras inventadas, atitude rock star nipónico-ocidental... um must!

 

  Performance multi-cultural


E agora confesso... todos estes meus conhecimentos derivam do facto de já ter ido outra vez ao Karaoke, desta vez com mais internacionais... e aqui têm a prova do meu desempenho! 

(eu, Nuno -Portugal -  e Freya - Belgica )

sábado, 17 de novembro de 2007

A maquete sem fim

Primeiro relato da  minha vida de estagiária. 

No primeiro dia de trabalho fui colocada na equipa de um concurso para um projecto para uma universidade, Keio. E esta não é uma universidade qualquer, é sim a universidade onde o meu boss ensina. Escusado dizer que a pressão era grande...

Para mim a pressão era outra. Não tanto o ganhar o concurso – isso é lá com eles – mas por ser a primeira vez que me deparo com um desafio tão tremendo quanto ... fazer uma maquete perfeita !!

Como disse noutro post, o meu talento de maquetista é um tanto duvidoso... a minha lógica é a das maquetes de estudo, para se ESTUDAR o que se pretende fazer, logo uma maquete deve ser transformável, remodelável, cortável, recolável etc etc. Para quem não faz maquetes, o resultado destas maquetes acaba por ser, em geral e especialmente no meu caso, algo bastante tosco, mas que cumpre o seu objectivo.

Agora nos ateliers Japoneses, a situação é bem diferente. Qualquer maquete, seja de estudo, final, de apresentação ao cliente ou final, tem de ser absolutamente PERFEITA. Não há marcas de cola, o cartão está sempre imaculadamente branco (o segredo da limpeza e da cola está num spray que não existe/não usamos em Portugal, e que limpa tudo. Até as marcas de tinta e cola na roupa), as paredes têm a espessura certa (não há simplificações: juntam-se os diferentes tipos de cartão que forem necessários, mas a maquete será igual ao real. IGUAL.), tal como nas lajes e, supra-sumo do pormenor, quando se juntam vários materiais para criar uma dada espessura, cola-se um papel à volta para não se verem as várias camadas.

Ah, já me esquecia do pormenor diabólico... à escala 1.200, todas as maquetes têm mobília. Imaginem uma mesa e cadeiras com 4 milímetros de altura... Graças a Deus ainda não tive de fazer mobília, senão aí é que ficava mesmo de olhos em bico!!

E das maquetes a 1.50 nem se falam ... levam televisões, materiais, quadros nas paredes, maçanetas nas portas ... uma arquitectura dos pequeninos !!

Sei bem que não sou uma autoridade para poder criticar, mas parece-me razoável dizer que são LOUCOS. E nem falo da eficiência/vantagem das maquetes com tanto pormenor, isto já é outro debate, com o qual não vos vou chatear agora.

Neste contexto, não admira então que estas maquetes sejam intermináveis.

Voltando um pouco ao tal Projecto para concurso.

Tivemos de fazer umas maquetes de estudo, mas a grande questão é que rapidamente passámos para a maquete final, independentemente de saber se se passava a primeira fase do concurso, porque os prazos de entrega entre fases eram muito curtos.

Logo, mais vale prevenir a atacar já os documentos (maquete) da fase seguinte – sabendo que na primeira fase a maquete não seria usada.

Nisto, após duas semanas desta minha primeira prova de esforço, onde tive de aprender a dominar novas máquinas e tudo, já estava a começar a ver algumas melhorias na minha qualidade de maquetista e ficar finalmente satisfeita com o que fazia.

A data da revelação dos resultados do concurso aproximava-se (quarta-feira), tal como a data da entrega da segunda fase (sexta-feira)... e consequentemente o stress também crescia, alguns dos “staff” começavam a fazer noitadas (noitadas são até às 5/6 da manhã, já que o horário normal é até à meia-noite...).

No auge da pressão, quarta-feira, sabe-se o resultado... não passámos. Ups... Melão.

 

Staff desiludido, Ban aparentemente a não mostrar grande emoção e estagiários frustrados por estarem a trabalhar para nada... no meu caso foi um sentimento misto de trabalho em vão versus ter de me matar mais dois dias caso tivéssemos passado... acrescentando o facto de agora não ter problema de consciência absolutamente nenhum por ter algumas partes da maquete menos nipónicas e bem mais toscas ! 

O que disse ao staff com quem mais trabalhava (que me pedia desculpa a mim por não termos passado... estranho...) foi que, on the bright side, foi o meu tempo de treino! Nada se perde, tudo se ganha...

Sobretudo para mim, obviamente não só em termos de talento de maquetista, mas sobretudo por perceber o sistema das grandes competições, o tempo investido, a preparação da apresentação... e como gerir a desfeita: atacar o próximo projecto.

Na meia hora a seguir à notícia metade dos estagiários já estavam a ajudar noutro projecto com entrega iminente, e eu recolocada para rematar mais uma entrega de concurso, mas desta vez com trabalho a computador (uff... sinceramente acho que estava a ficar com o dedo indicador mais musculado de fazer força no x-acto).

A partir da próxima semana tenho a sorte de trabalhar num projecto (já adjudicado) desde o desenho inicial...

 

Ah, a famosa maquete, essa, ficou duplamente sem fim!





 

Na sala de maquetes, com ar de fim de festa, e a famosa maquete ainda aos pedaços




Uma sala de aulas...

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Um extra ao post anterior


Em directo da Yamanote-sen








no segundo video passem à frente as minhas caretas...  
ponham o volume alto e ouçam a Miss JR





quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Commuter Life

Primeira novidade.

Entrei no mundo da Apple. De facto, o meu velho computador estava a dar sinais de fim de vida e, após um bom estudo de mercado e a constatação de uma diferença de preço significativa, optei então por tornar-me uma mac user. MacBook preto.

E que maravilhoso mundo novo! Estou conquistada... pelo design (é preto, 13 polegadas widescreen .... lindo), pelo sistema ... tudo. E sinceramente arranjar programas não é assim tão complicado...

Feliz e contente estou eu portanto, com o meu novo “friend for life” no colo – palavras de uma do atelier, utilizadora há já alguns anos.

Sim, no colo, porque não estou em casa, mas no comboio.

Parece-me que atingi o estado derradeiro de vida no comboio... vir de computador atrás e trabalhar nele. Se estivesse em Portugal, provavelmente não me aventurava a tal coisa. Teria pessoas a olhar de lado “olha esta a exibir-se”, e outros eventualmente a pensar como me assaltar... E obviamente, outros tantos a lerem o que escrevo.

Mas aqui, onde todos exibem algum sinal de riqueza – em equipamento electrónico ou em acessórios Louis Vuitton e companhia - e onde a segurança é extrema – poderia adormecer profundamente com o computador ao colo que ninguém me levaria o portátil – estou confortável e segura a escrever-vos.

Por acaso os japoneses até são bastante fofoqueiros e cuscos, de maneira que o senhor sentado ao meu lado esteja provavelmente a ler o que escrevo (a senhora do outro lado dorme...), mas a probabilidade de perceber o que escrevo é bastante remota.

Estando no comboio, aproveito a ocasião para escrever sobre a minha experiência de “commuter” nestes quase dois meses (já!!).

Primeiro, o próprio termo de “commuter”, ou seja “a regular journey of some distance to and from one's place of work.”.

(entretanto mudei de linha ... estou agora na Yamanote, a linha circular de Tokyo... e como apanhei numa boa estação, está praticamente vazio e tive lugar para me sentar e ... continuar a escrever)

As viagens de comboio têm se demonstrado como um pequeno observatório da sociedade japonesa... assim como um pequeno tubo de ensaio, no qual também me encontro – sentido por vezes os seus efeitos – mas onde permaneço, apesar de tudo, uma observadora. Por pontos, as minhas primeiras deduções:

1º. Como provavelmente já sabem, a cultura japonesa é extremamente ascética na demonstração de afectos, no toque... não se dão abraços, não se dão beijinhos e só quando há já alguma relação de amizade se põe uma mão no ombro, se dá uma palmada nas costas ... etc. (dada a evolução da sociedade, começam a ver-se casais com alguma demonstração de afecto ... mão dada, cabeça no ombro, etc, mas raros são os que vão para alem disso)

No metro/comboio, todos estes pudores desaparecem. Andamos colados, a respirar no pescoço do vizinho, os corpos em conjunto movimentam-se conforme o baloiçar da carruagem – em certas situações quase se perde o equilíbrio, mas sempre em silêncio ... fosse em Lisboa estava tudo aos berros....

**actualização temporal: 12 horas depois, no meu quarto ... queria ter continuado a escrever na viagem de regresso, mas estava tão cheio que foi impossível.

Esta viagem de regresso foi mais um exemplo de “sardinhite”. Estava praticamente ao colo de um que estava sentado (sortudo).**

2. O comboio como um conjunto de bolhas pessoais.

Explico: no metro, tudo se faz: maquilhar-se, escrever no telemóvel, ler jornal, ler livros, jogar playstation (versão portátil), escrever no computador – não sou a única - e claro, dormir.

Só há duas coisas que não convém fazer: comer e falar ao telemóvel. Comer ainda se percebe, mas agora falar ao telemóvel confesso que não percebo ... ainda por cima os telemóveis andam sempre em modo silêncio (se tocar em alto e bom som olha tudo). Se estivesse com alguém ao meu lado à conversa, faria o mesmo barulho... Nestes dois pontos, comer e falar ao telemóvel, assumo a minha posição de estrangeira e quebro as regras.

Todas estas regras subliminares ao uso do metro remetem à sua principal característica: a total ausência de relação com o próximo. Posto de outra forma, é como se cada pessoa saísse de casa com uma bolha à volta do seu corpo, transportasse essa bolha para dentro do metro e, protegida dentro dela, continuasse a sua vida pessoal, apesar de rodeada por uma quantidade de incógnitos.

Talvez seja exactamente este anonimato que permita estar tão abstraído do que (dos que) nos rodeia...

 

3. O exemplo mais característico de viver na sua maior intimidade apesar da marabunta que nos rodeia: o dormir.

Já repararam como o dormir é a anulação completa do controlo sobre o nosso corpo e sentidos?

Ao dormir ressona-se, abre-se a boca, baba-se, cai-se para o lado (para cima do ombro do vizinho, que por respeito ou pela regra implícita de não entrar na bolha pessoal do próximo, não o afasta). Que espectáculo humano !!

Confesso que já me aconteceu. Sim, já adormeci profundamente no metro, ao ponto de deixar passar a estação. Fui niponizada...

E sempre que acordei, sentia-me estranha, exactamente por ter perdido o controlo da situação, ter passado tempo sem eu dar por ele. Será que ressonei? Abri a boca? Incomodei o vizinho?

Tenho de me conformar: dentro das regras implícitas da sociedade japonesa, seja qual tenha sido o meu momento de Morfeu, nada disto tem importância...


Em jeito de nota final, e abertura a um post em preparação:

a vida de comboio é característica de um traço fundamental da sociedade japonesa:

as contradições. 



E agora uma imagem perfeitamente única...


quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Ando lab

Apenas um pequeno link, para o site do "Ando lab". Não vão (nem eu) perceber nada do site, que é todo em Japonês. Só o ponho aqui por piada, porque se clicarem em "news"... têm uma fotografia do Jan (o belga), minha e do Jun, que fez no ano passado o mesmo programa que eu ... mas em Lisboa !

http://ando-lab.ta.chiba-u.jp/ando/index.htm

e para os preguiçosos aqui está a fotografia ...



Explico o termo "ando lab": Nas faculdades de cá misturam os alunos dos vários anos num só " laboratório", dirigido por um professor, no meu caso o "famoso" Masao Ando, e que vai orientando tanto os projectos como as teses dos vários alunos.

Em termos espaciais, um laboratório corresponde a um conjunto de salas: uma de aulas, um escritório - com papeis e dossiers até ao tecto .. nunca vi coisa assim!!- e várias salas para os alunos, onde cada um tem a sua mesa, umas mesas maiores para maquetes, uma cozinha improvisada e um "lounge" também improvisado. Note-se que de noite todos estes espaços se transformam em dormitórios improvisados !! Todos os alunos guardam na faculdade um saco de cama, toalha, roupa extra, escova de dentes... Acho que já tinha explicado uma vez que os alunos cá vivem na faculdade... literalmente.

Descobri no computador uma fotografia que ainda não tinha publicado, não da minha faculdade, mas do campus da Universidade de Tokyo, em Tokyo mesmo. Qualquer parecença com um campo de refugiados é mera ilusão !

bug busters

Não tendo comigo o cabo da máquina fotográfica, e por consequente não podendo publicar histórias com imagens, conto apenas um pequeno episódio que aconteceu há... uma hora.

Chegando ao meu quarto/casa, abro a porta e vejo um papel no chão, que não podia ter sido posto por debaixo da porta, porque estava em cima do degrau, um metro mais à frente.
Noutro país qualquer, o primeiro pensamento seria "Assaltaram-me o quarto e deixaram um papel fora do sítio". Mas sendo o Japão um dos lugares mais seguros onde já estive, o único pensamento foi "olha que estranho, um papel no chão".

Acendo a luz, pego no papel e leio :

"今日私達は殺虫剤と部屋に吹きかけてしまった。
それらを使用する前に燻蒸が皿を洗浄した後。
あなた自身によって昆虫の残物を投げなさい

Today we have sprayed the rooms with insecticides.
After the fumigation please wash the dishes before you use them.

Please throw away the remains of insects by yourself."

Perante isto, a apatia desapareceu e passo a transcrever os meus pensamentos em cadeia:

- O quê ?!? Entraram-me no quarto ???

- Vá lá estava arrumado....

- remains of insects ?!?! URGHHHH só falta chamarem-lhes "corpses..." ou"dead bodies"

- uffff não tenho cá cadáver nenhum...
prova de que o quarto está bem limpo!
(depois de inspeccionar o quarto em bicos dos pés)

- "please wash the dishes before you use them"...

- ok... então mas espera lá ...

- e a minha cama ?! e a almofada ?!
vou snifar insecticida a noite toda ?!?

- e a minha roupa ??

- e os saquinhos de chá que
não estavam hermeticamente fechados ?
vou
passar a tomar chá de insecticida ?!?

Está decido e executado: loiça toda lavada, chá para o lixo, e hoje durmo no saco de cama.
O que vale é que metade da roupa estava a secar na varanda... (vou acreditar que não atacaram a varanda, que os bichos não rastejaram para fora para cima da minha roupa... senão dou em louca!!).

Imaginem o meu espanto final quando, depois de me fumigarem o quarto, sem qualquer consideração pelo que cá estaria dentro e sem qualquer pré-aviso, a única prova da presença de pessoas no meu quarto, para além do famoso papel no chão, e como prova de que estou no país tecnológico, a única prevenção tomada pelos meus "bug-busters" foi ... um plástico gigante por cima do computador !!

- oh minhas espertezas...
eu não como nem respiro computadores !!!!


Falha momentânea

Meus queridos amigos e família
( e porventura mais algum leitor que tenha descoberto este blogue...)

Não imaginam o contente que fico por saber que andam a seguir o blogue atentamente e que, se por acaso me ausento durante mais algum tempo, tenho mails a pedir mais notícias!

Escrever no blogue dá-me imenso gozo e é uma forma de manter algum registo desta aventura. Mas saber que é acompanhado dá-lhe todo outro sentido...OBRIGADA !!

E facto é que na passada semana não lhe dediquei tempo nenhum. Não por falta de histórias por contar (como verão) mas falta de tempo. Posso estar a viver no futuro (nos vários sentidos da palavra !) mas o tempo aqui não estica. Até parece mais curto.
Entre o estágio (e as suas longas horas), as aulas (com uma entrega à vista), e as minhas 2.30 horas de comboio diárias... sobra pouco tempo para aqui escrever. Confesso também que nesta semana ganhei um pequeno vício... ver "Heroes" por Internet. Não sei se conhecem, se vêem ou não ... mas tem me agarrado todas as noites ao computador, um episódio por dia (sábado de manhã fiz uma pequena maratona de três episódios...).
Antes de fazerem juízos, deixem-me tentar explicar (desculpar ?) o vício: não vejo nem televisão nem um filme no cinema há um mês e meio ... sinto imensa falta de ir ao cinema (cá a maior parte dos filmes são japoneses, os internacionais estreiam tarde e é caro...) e sim, daqueles minutos de couch potatoe sem pensar em nada. Daí que, quando descobri os Heroes... pegou.
Para tentar validar ainda mais um pouco a minha adição, devo dizer que não sou um caso único. Estava no outro dia com um grupo de internacionais e, em 12, 8 estavam também agarrados ao computador para ver esta série... ! É o fenómeno estudante que vive num mini-quarto sem televisão.

Mas agora a adição está cada vez mais controlada e volto a dar mais atenção ao blogue!